- Vai pra casa direto? - O loiro perguntou, enquanto seguiam em direção ao ponto de táxi.
- Quem dera. Lúcio acabou de me mandar um sms, preciso passar em Ninfotopia antes. - O negro parecia mau-humorado, olhando a tela de seu celular.
- Problemas no paraíso? - Debochou o pintor.
- No dele, deve ser, a mulher não o deixa em paz. Ele fica tendo que ir pra casa cedo e a boate não pode ficar abandonada.
- Que merda de sócio tu arrumou, o trabalho inteiro é teu, mas o cara tem a parte dele na grana.
- Ele administra a casa melhor do que eu, sem falar que a grana de entrada foi dele. - Contra-argumentou Roberto.
- Que seja, cara, só sei que eu vou pra casa, dormir por uma semana. - Falou, entrando no táxi que acabara de chegar.
- Valeu cara, se cuida. - Despediu-se o amigo.
Giovanni apenas acenou com a cabeça, antes de fechar a porta. Roberto esperou que o táxi virasse a esquina, se virou e foi em direção a uma imensa moto negra, parada no final da rua. Aquele não era um dos lugares mais seguros do Rio de Janeiro e, com certeza, a moto não teria ficado inteira se estivesse lá a muito tempo. Deu um sorriso de canto. "Timing perfeito, Lucius."
Montou no veiculo e saiu do queimando o asfalto, numa velocidade surreal. Ele desviava de todos os obstáculos com uma habilidade inumana e seguia cada vez mais rápido, dificilmente veriam algo mais do que um borrão escuro riscando as avenidas desertas do centro as 3:00h da manhã.
Em menos de 30 minutos estava em frente ao Campo de Santana, na Avenida Presidente Vargas. Parou a moto e viu alguns moleques sentados na saída da estação do metrô. Pareciam estar cheirando benzeno e mal olharam pra ele. Roberto desceu da moto e puxou o descanso para que ela não caísse, agora os garotos olhavam pra ele.
Começou a andar em direção ao parque, usava botas negras de montaria, uma calça jeans escura, uma camisa azul básica e uma jaqueta de couro preta. Um dos moleques parou na frente dele e falou.
- Tem um real, tio? Tô com fome. - O garoto era magro e tremia de frio, mas os olhos vermelhos e o cheiro de bebida barata deixava claro pra que serviria o dinheiro.
- Não sou seu tio e não dou dinheiro pra vagabundo. Vaza moleque. - Respondeu ele indiferente, seguindo em frente sem olhar pro garoto.
- Pô, qual é, só um real, tio, quê que custa?
- Custa um real, agora me deixa em paz. - Ele continuava, seguindo em direção a esquina do Saara.
- Ah, é? Então vai ser na marra! Passa tudo! - O pivete falou, parando na frente de Roberto com um canivete em punho.
O negro olhou para aquela criança que tinha pouco mais da metade de seu tamanho, o garoto vestia trapos e sua mão tremia devido ao vício. Quão decadente um humano poderia ser? Até onde se permitiam chegar? Aquilo era patético.
- Garoto, olha pra você, quer mesmo brigar comigo? - Tentou ainda argumentar. Os outros garotos de rua viam a cena curiosos, sem se intrometer.
- Não quero brigar não, mané, eu quero é a tua grana e a chave da moto, bora! - O pivete gritava, como se isso o tornasse mais ameaçador.
- Me deixa passar. - Falou o homem, dando um passo a frente. O moleque tremeu, mas não se retirou. - Moleque... Me deixa passar! - Bradou, empurrando o garoto tão rápido e com tanta força que este voou até o meio da pista. Sua sorte era naquele horário pouquíssimas pessoas se arriscarem a passar pelo centro da cidade.
Roberto ficou olhando para ele se levantar e sair correndo. Os outros garotos ficaram quietos, sem quererem apanhar também. Finalmente ele entrou na esquina e seguiu até um ponto em que dificilmente seria visto, escalou as grades como facilidade e pulou num canteiro dentro do parque, espantando diversos gatos vira-latas no processo.
- Hunf, animais imundos. - Murmurou, seguindo mais para dentro no parque, que servia de moradia para diversos vagabundos e para... - Achei! - murmurou, dando um sorriso vitorioso e se escondendo entre as arvores e arbustos para não ser visto.
Observava duas garotas que aparentavam ter 5 anos, gordinhas e baixinhas, de membros roliços. Tinham cabelos cacheados azuis e grandes olhos multifocais verdes, como os de borboletas. Voavam, erguidas por asas rosas translucidas, em volta de um garotinho moreno, de olhos castanhos, que tentava tocá-las, encantado. Mas sempre que ele se aproximava, as duas voavam mais alto e riam, alto e estridentemente, enquanto continuavam com essa brincadeira. Os olhos do garoto estavam sem brilho e a roupa encharcada de suor indicava que a brincadeira já durava horas. O garotinho usava um short jeans curto, tornando possivel ver os joelhos ralados, provavelmente, devido as inúmeras quedas resultantes de tentativas de alcançar as garotas aladas.
- Vadias. - Murmurou Roberto, apertando a adaga que levava no pescoço.
Respirou fundo, se concentrando e a arma foi crescendo em suas mãos, até que nelas só coubesse o punho de uma espada curta e curva. Levantou-se da forma mais discreta que pode, com a lâmina em punho e ficou satisfeito ao ver que não havia sido notado. As fadas estavam interessadas demais em brincar com sua pequena vítima. Não o viram, não sentiram seu cheiro, não ouviram seus passos. Ele moveu-se em uma velocidade sobrenatural e passou por ambas fazendo um arco perfeito, parou de costas para ambas e virou-se a tempo de ver as pequenas cabeças gordinhas indo ao chão, sendo seguidas dos corpos. Pegou o garoto no colo e este, livre do encantamento, nem mesmo foi capaz de chorar antes de desmaiar por esgotamento. Deitou-o no chão por um instante.
Tornou a concentrar-se e a espada voltou ao tamanho de um pingente. Os corpos das fadas já não passavam de dois pequeno montes de poeira brilhante. Recolheu o máximo que pode em uma garrafa prateada, tipica de se levar whisky, e tornou a pegar o garoto no colo, levando-o para fora do parque.
Continua...
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